“Salas de Lata” em Campo Grande comprometem aprendizado

Calor extremo e falta de infraestrutura transformam educação em sofrimento

A qualidade da sala de aula é pré-requisito fundamental para que os alunos possam ter acesso a uma educação de qualidade. Em Campo Grande, a opção pelas chamadas “Salas de Lata” na Rede Municipal de Ensino (Reme) trafega na contramão do bem senso, relegando alunos e professores a um ambiente desconfortável, que não colabora para o bom aprendizado.

O projeto das salas modulares teve investimento de R$ 40 milhões para construção e 143 unidades na gestão da prefeita Adriane Lopes. Os módulos são feitos de chapa de aço com espuma. Não tem ar condicionado e nem banheiros. O resultado: calor insuportável, aulas canceladas e alunos abandonando os estudos. Somados a uma infraestrutura deficitária, falta de material de estudo, de computadores, e até de papel higiênico nos banheiros, a situação das salas está transformando a educação pública campo-grandense em um case de fracasso.

“Será que o caminho é esse? Salas modulares de metal, sem nenhum tipo de infraestrutura, sem conforto, sem ar condicionado, sem banheiro? De que adianta aumentar o número de alunos desta forma, sem dotar o resto a escola da infraestrutura necessária, sem planejamento? Vamos seguir o exemplo do Estado, com reformas que sejam feitas para durar 30 anos”, disse o deputado federal Beto Pereira, pré-candidato do PSDB à Prefeitura da capital.

Pais dos alunos da Escola Municipal Plínio Barbosa Martins, no Jardim das Macaúbas, por exemplo, já denunciaram a falta de ventilação das salas de aula da instituição. Eles afirmam que os alunos dos anos primários foram colocados no local sem janelas desde o começo do ano letivo. Questionada, a Prefeitura de Campo Grande, por meio da Semed (Secretaria Municipal de Educação), diz que as unidades escolares receberão energia fotovoltaica, para, então, receber os aparelhos de ar-condicionado.

Enquanto isso, os estudantes são submetidos a humilhações públicas, como a que ocorreu em março, quando um bilhete enviado aos pais de alunos por uma escola da Reme reclamava de ‘chulé e cecê’ das crianças e adolescentes. No bilhete, a escola orientava sobre banho antes da escola, uso de desodorante, cuidado com os pés e escovar os dentes. “Seria bom se as salas tivessem um mínimo de condições para que nossos filhos não suassem em bicas”, disse uma mãe que pediu para ter sua identidade preservada.

Estudos mostram a importância do ambiente no aprendizado

O ambiente físico em que os alunos estudam pode influenciar significativamente seu desempenho acadêmico, comportamento e bem-estar geral. Estudos recentes e depoimentos de especialistas têm destacado a necessidade de ambientes escolares que promovam o conforto físico e emocional dos estudantes, especialmente nas escolas públicas, onde os recursos muitas vezes são limitados.

Segundo a professora Maria Eduarda Souza, especialista em educação e desenvolvimento infantil, “o conforto na sala de aula vai além de cadeiras e mesas adequadas; envolve iluminação apropriada, temperatura controlada e um ambiente acolhedor. Estes fatores podem afetar diretamente a concentração e a capacidade de aprendizagem dos alunos.” Souza argumenta que salas de aula bem projetadas e confortáveis podem reduzir a fadiga e a distração, permitindo que os estudantes se concentrem melhor nas atividades pedagógicas.

Além disso, o psicólogo escolar Ricardo Almeida, em um estudo publicado na “Revista Brasileira de Psicologia Escolar”, em 2021, enfatiza a importância do conforto emocional. Almeida explica que “um ambiente confortável e seguro pode minimizar o estresse e a ansiedade, sentimentos que são comuns entre adolescentes e que podem prejudicar seu desempenho acadêmico.” Ele acrescenta que um ambiente acolhedor, onde os alunos se sentem valorizados e respeitados, pode aumentar a motivação e o engajamento nas atividades escolares.

Esses depoimentos refletem uma compreensão crescente de que o ambiente escolar deve ser visto como uma extensão do processo educativo. O conforto físico e emocional é crucial para criar um espaço onde os jovens possam se desenvolver plenamente. Em escolas públicas, onde as desigualdades sociais e econômicas frequentemente se refletem nas condições físicas das instalações, a atenção ao conforto dos alunos é ainda mais crucial.

“Investir em mobiliário ergonômico, melhorar a ventilação e a iluminação, e garantir que as salas de aula sejam espaços acolhedores e seguros são passos essenciais para promover um aprendizado efetivo. Como as evidências sugerem, esses investimentos não são apenas uma questão de infraestrutura, mas sim uma componente fundamental de uma educação de qualidade que pode ajudar a fechar as lacunas de desempenho e proporcionar a todos os alunos a oportunidade de alcançar seu potencial máximo”, diz Beto Pereira.

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